Tuesday 23 April 2013

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use uvas passas cintilantes para agregar dromedários sussurrantes a centopeias saltitantes.

o o o o o o o o o o o o o o

bolinhas bolinhas bolinhas. 
bolinhas, o que?
bolinhas, oras bolas.

Wednesday 17 April 2013

quem

moço não peça minha identificação. não estou identificada com aqui. daquilo que gosto, são simpatias, não sou eu. das outras, não deixo de ser um pouco de mim, daquilo que não é oposto, nem contrario. não sinto-me contrariada por não ser aquilo que você me pede. nem acho justo que me peça para ser isso aí que você gostaria que eu fosse. eu não sou mais do que aquilo que sou. e o que eu sou é segredo até de mim mesma. eu sei pouco moço. eu não sou este lugar. nem essas pessoas. não me peça para ser igual. nem me peça para ser diferente. não insista em me preencher de desejos. tudo vai passar mesmo que eu insista em não querer deixar. então escolho não querer. me identificar.

fever thoughts

a febre. sonhos. harry potter. porque? um teatro. um ritual. explicações sobre a morte. acho que ja vou indo. e se tudo acabasse agora? esse corpo. essa cara. esse adeus seria mais simples. se ela sorrisse calmamente eu não resistiria.

still on

ela nunca faz nada esta mariposa. que mariposa? a mariposa do teto. não faz nada. faz dias que fica no teto. assim. sem fazer nada. que mariposa no teto? nao voa. não fala. não faz nada. fica ali ó, a mariposa. marrom. ainda por cima é marrom. a mariposa marrom. o silêncio dela me incomoda. porque não faz nada essa mariposa? porque não voa embora? fica aí. no teto. parada. só faz isso da vida. fica parada no teto aqui de casa. ela pensa que eu não percebo. mas ja faz uma semana que ela não se move. mariposa marrom imóvel. deve estar escondendo algo essa mariposa. mas o que? o que será que fez com essa mariposa viesse ao teto da minha casa não fazer nada?

de volta dê volta

temos mochilas de todos os tamanhos. carregamos nossas bolsas nas mãos. nas costas. ele, acordava todos os dias numa terça-feira. idealizara um mundo de finalidades conceituais. numa escala de tempo sem tempo. era continuo. e ele crescia de dentro pra fora. nasceu. e depois morreu. e depois nasceu de novo. você acredita na reencarnação? carnicizar-se o espirito que passa por um processo. eu não sei. porque alguem inventou que havia um linha. e depois de grande ele descobriu outras possíveis possibilidades. eu te conheci agora mesmo? afinal, no final, o que acontece de verdade se você nao pagar suas contas? que verdade? que final?

Friday 12 April 2013

patas podem

os homens falavam da cena do panda. o panda. o panda. o ônibus. o binóculo. o rinoceronte alado. o homem falando do urso. o urso se vestindo de homem. o ônibus andando pra longe. o lago engolindo a água do corre. escorregou no sabão dum chão enorme. esfregou a cara com um sabonete nobre. sentou no topo de um arbusto mole. segurou-se na ponta árvore um bicho enorme. passaram a cena do panda na tela. patê de panda não se come. os homens que no ônibus entraram pandas. saíram do ônibus homens.

Sunday 7 April 2013

frederico

é que ele não gostava da escola. ele preferia o isolamento. e aquele tumultuo o incomodava a alma. barulho. preferia o silêncio ao social. preferia o virtual ao real. porque também não entendia o que havia de tão real assim no que lhe era apresentado como verídico. ruídos as vezes se transformam em monstros. via. não entendia porque as pessoas discutiam tanto. palavras. havia solução. percebia. talvez se as pessoas falassem menos. pensava. e as pessoas se expondo tanto naquele contexto. falavam. talvez as palavras trouxessem em si algum peso. pesava. um sofrimento que ele preferia evitar. você deveria falar mais. ouvia. e mais quieto ainda se estabelecia. em sua sabedoria, sabia, que alguma paz, sentia.

Friday 5 April 2013

e tinha aquela cena do elefante tomando banho de mar. outro dia a gente tava sentado na costeira e apareceu uma tartaruguinha. tem também aquele cara da ótica que fala que nem propaganda. será que ele ensaia no espelho? bateu um cheiro estranho pela janela. será o lixo da dona odete? nos escritórios da frente as pessoas devem estar contando os minutos para as seis. é o funk da batatinha.

guilherme

é que eu estou sofrendo muito. você entende? e daí eu fui tentar me conhecer melhor. procurar a origem do meu sofrimento. e fiquei ali, sentado naquele gramado por umas horas matutando. suely, eu acho que o que me faz sofrer é amor. cê numa acha estranho isso da gente ter de esconder que ama? parece que a gente não pode apreciar as pessoas. eu quero ficar de boa. gostar de mim. gostar das coisas, sabe. e eu não quero mais ter de sentir raiva das coisas. essa raiva, eu acho que ela não é minha. e eu fiquei me esforçando pra sustentar isso achando que isso era ser forte. agora pensando bem, aquilo não era raiva. aquilo acho que era um impulso de amor. só que eu tava tentando fingir que não. olha que bobagem. e eu podia passar a vida toda nesse sofrimento desnecessário. que coisa lôca.

Thursday 4 April 2013

e tinha este homem cheio de anéis nos dedos. chapéu preto. bengala na mão. barba branca. olhos cor de chuva. um caderninho de anotação. vem aqui mais perto que te conto o segredo. caminho. olha, isso que eu vou te dizer, você não diga pra ninguém, ta bem, meu bem? deu-me a mão. mostrou-me minha vida toda em um segundo. suspirei. entramos juntos num túnel. e acabou.

ô se é

porque quem é o caipira contemporâneo? perguntou seriamente o senhor com cara de sério senhor. e se eu fosse mais treinada pela cidade cheia de caixas, eu teria dez milhões de palavras para descrever alguma coisa mais concretamente pra você. mas sou mais caipira que isso aqui seu moço. e me perdi olhando praquela nuvem que parecia assim um hominho sentado num banco tocandum violão. porque fui me perdendo em pensar em alguma coisa meio assim sem fundamento mas que eu tava gostando de pensar por que sim e só isso. talvez seja uma certa mania de quem cresce assim conversando com as mesmas pessoas todos os dias antes de virar o quarteirão. bom-dia-como-tá-a-senhora-e-o-gato-melhorou? como-tá-o-seu-joão? tô-indo-pra-cidadi-quer-alguma-coisa-du-mercadu? e no meio de pedidos e atualizações cotidianas a gente filosofa sobre alguma coisa que já foi descoberta mas que a gente acha que se conversar sobre ela vai descobrir algo novo de novo. ou pelo menos vai ter um assunto pra assuntar. porque caipira é um pouco poeta. e é um pouco doutor. e um pouco xamã. e um pouco padeiro. e pedreiro. e professor. porque caipira prefere o café da tarde pra poder papear melhor. e é um povo que sabe das coisas. mas é mais de olhar. é de ouvir as histórias que a tia bernadete gosta de contar. porque caipira gosta de passear com a cabeça. a imaginação do caipira é o que ele talvez tenha de secreto. de gigante. de infinito. a cabeça do caipira vai longe. é por isso que ele tem algo de hoje. e algo de eterno. algo de gente de verdade. e algo de mistério. o caipira não se descreve. nem quer saber do tamanho que tem. nem sabe direito pra onde sua vontade parar. se ela não quer parar, num pára, praquê-ué. o caipira é meio esquerdo. meio torto. meio tonto. meio madeira. meio vento. meio tempo. ele não se entende. e nem se quer entender. senão perde a graça. e caipira gosta de ver a graça das coisas. porque o caipira acha que sabe que as coisas num são assim tão desse jeito. nem tão daquele lá. e no meio disso tudo, ele ri um pouco, dentro de si. com um certo lamento. com uma vontade entristecida de chorar.

Wednesday 3 April 2013

lidiane

lidiane ao ligar o liquidificador iniciou pensamentos processuais sobre pesquisas cientificas. pensou na história da humanidade. pensou em trituradores. em máquinas. em moedores. pensou na vida na caverna. em tribos. em monastérios. pensou na descoberta do gosto do cacau torrado. no estouro da primeira pipoca. no grafite posto no meio do pedaço de pau talhado. pombos correios. telegrama. programa de rádio. partituras musicais. lembrou da reportagem sobre um menino que afiava pianos para paulistanos em são paulo. pensou em trilhos de trens. em pessoas que decidem ser pilotos de avião. lembrou das promessas que sergio fazia na infância. pensou nos túneis do antigo egito. pensou no que será que cleopatra pensava antes de deitar com a cabeça no travesseiro. será que já existiam travesseiros por lá? será que eram penas de pato dentro de um saco de estopa? será que tinha pato no egito? não sabe. o suco já está pronto. engoliu o copo de goiaba batida com leite. e adormeceu no sofá sem escovar os dentes. babou na almofada. e sonhou que estava passeando pela cidade de tatuí com seu primo gustavo, que não via desde a terceira série do primário.

sobre bolhas e bolas brilhantes microscopicamente falando do ponto de vista dos céus

dizem que o que conta é matemático. creem na ciência como prova de tudo. aí vêm os outros do lado de lá contradizendo o que você tinha dito antes. mas aí vem você querendo que eu demonstre a coerência dos meus pensamentos. mas eu era mais multidimensional que isto que você pedia. eu vinha de um lugar sem linhas. eu vinha de um lugar mais arredondado. circular. bolas de luz no céu. eu mesma morava em cima de uma bola. e eu era toda cheia de água dentro de mim. disforme. eu era uma solução. cheia de minérios por dentro. e eles também eram bolas. bolinhas concêntricas cheias de agitação afinidades aleatoriedades e ciclos. e daí você me perguntava qual era meu ponto. e eu não sabia se você queria saber o nome da minha rua. ou o nome da minha lua. então eu rabisquei uma estrela pra você me conhecer melhor. e depois eu estiquei o tecido. e aquilo foi virando uma rede disforme. cheia de pontinhos. e os pontinhos foram crescendo. e ganhando patinhas. e antenas. e dentes. e olhos. e unhas. e línguas. e vozes. e árvores. e cadernos. e pianos. e sentimentos. e sapatilhas. e passos. e abraços. e amaciantes de roupa. até poeira cósmica, aquilo virou. tudo isso, e mais um monte de combinações químicas. e alquímicas. elementares, meu caro. incontestável bruxaria, alguém ousaria dizer.

Tuesday 2 April 2013

jurandir

e então é manhã de terça. e ele vem à minha porta. olhar azul. e calmo. uma voz tranquila. ofereço uma xícara de café. ele aceita. deixamos a porta aberta para facilitar o processo. ele abre a lata de tinta. revesa as mãos entre o café e o rolinho cheio de branco. começa a contar-me num tom brando, sobre sua trajetória. é do maranhão. chegou no interior jovem. e foi de cara aprender a trabalhar com a guilhotina. cortava vidros para luminárias para exportação. coisa fina fernanda. mas depois dos trinta e cinco, já não te querem mais. e me ensaia a loucura. cinquenta horas semanais de trabalho. na metalúrgica, noventa por cento do funcionários adoece. pode procurar. quando eu saí, meu corpo ficou cheirando óleo por seis meses, eu sentia o cheiro. e tenho três amigos que enlouqueceram trabalhando lá. o som. as máquinas. o cheiro. o ferro. entra na gente. e eu já não sabia mais o que era esquerda. e o que era direita. é a depressão. todo mundo fica deprimido na metalúrgica. eu imagino. só imagino. ele sabe. e teve outro que teve pânico. sabe o que é pânico? acho que não sei moço. ele segue com o rolo. minha porta mais branca. eu, mais bege. ele me conta que o dono da fabrica lia gibi no meio do turno. e que ele queria pagar o café para os funcionários com o dinheiro do bolso. nem café a gente tinha. teve de sair. mas sente saudade de alguma coisa. algum canto seu que aprendeu a conviver com aquela história. e veio chegar em são paulo agora. aqui, você tem de perguntar muito, senão te enrolam. é verdade moço. eu não faço isso aqui. isso aqui não sou eu. me mostra uma foto de uma casa. eu que fiz, com minhas próprias mãos. mas agora é só saudade, sofre. eu me encolho. aquela enorme varanda vendida para uma família da praia grande. e sua filha, morando expremida nesse prédio. ele agora estuda para terminar os estudos. é que eu não sou bom de matemática. mas consigo interpretar qualquer desenho. me conta que gosta de ler. eu falo para ele escrever isso tudo. ele me pergunta se dá pra escrever sobre isso. escreva por favor. enquanto ele não começa, eu sento meio asfixiada aqui no computador. ele, agora na casa do lado, segue clareando nossas portas. num ar sereno. guardando num corpo pequeno. essa intangibilidade sua.